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Vênus × Vênus: quando o nome é parecido, mas o problema é real

  • Foto do escritor: Andressa Wulf
    Andressa Wulf
  • 6 de ago.
  • 5 min de leitura
Camila Fremder durante a gravação do podcast Vênus Day Talks, sentada diante do microfone, visivelmente desconfortável, ao perceber que estava no programa errado.
Renata de Paula e Camila Fremder no Vênus Day Talks

A confusão entre os podcasts Vênus Podcast e Vênus Day Talks escancarou uma verdade desconfortável: em um mercado cada vez mais competitivo, não basta ser conhecido. É preciso ser protegido.


Embora eu atue em outras áreas do Direito, o caso recente envolvendo a escritora Camila Fremder e o podcast Vênus chamou minha atenção pela relevância jurídica e social. Decidi, então, escrever sobre o tema para ampliar o debate e oferecer uma reflexão acessível.


A protagonista involuntária do episódio foi a escritora Camila Fremder que, ao aceitar participar de um podcast chamado "Vênus", acreditou se tratar do conhecido Vênus Podcast. Chegando ao estúdio, percebeu estar no Vênus Day Talks, projeto recente, com proposta e público distintos. O constrangimento foi filmado, viralizou e gerou debate nas redes. Embora tenha parecido apenas uma gafe, o caso revelou três falhas estratégicas que merecem análise.


1. O convidado que não verifica e confia apenas no nome.


Camila não é novata. Está acostumada com convites, mídias e gravações. Ainda assim, não checou detalhes básicos antes de confirmar a participação: quem eram as apresentadoras, se era o programa que imaginava. Confiou apenas no nome.


É fácil cair nessa armadilha quando o nome é similar ao de algo já conhecido. No entanto, no mundo da comunicação, a aparência de familiaridade pode esconder outra marca ou outro posicionamento. Camila lidou com a situação com bom humor, foi bem recebida, mas a experiência serve de alerta: nem toda marca parecida é a mesma e isso importa muito. Para quem trabalha com mídias sociais, a atenção aos detalhes é ainda mais essencial, pois o nome, a imagem e o ambiente onde se fala também comunicam.


2. O projeto que escolheu um nome semelhante demais


Do outro lado está o Vênus Day Talks. Um podcast novo, voltado às mulheres maduras, com proposta diferente do Vênus Podcast. No papel, tudo certo. Ainda assim, o nome escolhido se parece demais com outro já existente.


A equipe do Vênus Day Talks alega que o nome reflete uma estética própria e que a palavra “Vênus” é de domínio público. Além disso, registraram o nome no INPI em 2024. Tudo dentro da legalidade. O ponto é que, quando se sabe da existência prévia de uma marca forte, o cuidado precisa ser redobrado. Quem chega depois tem o dever de evitar associação.


Mesmo que a semelhança não tenha sido intencional, ela se mostrou inevitável. E isso já basta para gerar dúvida e embaralhar a percepção, tanto do público quanto dos próprios convidados.


3. O sucesso que esqueceu de se proteger


O Vênus Podcast é mais conhecido. Tem audiência sólida, presença digital forte e reconhecimento nacional. Ainda assim, nunca registrou sua marca no INPI.


Conforme a Lei da Propriedade Industrial, a proteção da marca nasce com o depósito do pedido, não com o número de seguidores ou a quantidade de episódios gravados. Sem o registro, o podcast pode ser surpreendido por limitações de uso ou até por ações de terceiros que decidiram se antecipar.


É como construir um prédio inteiro num terreno que não está em seu nome. A qualquer momento, você pode ser convidado a desocupar.


O déjà-vu do Calabreso


O caso Vênus lembra outro episódio recente: a disputa pelo termo “Calabreso”. Em 2024, o humorista Toninho Tornado, criador do bordão, viu a expressão viralizar no BBB e outra pessoa correr para registrá-la no INPI. O Instituto ligado à ex-mulher de Davi Brito, Mani Reggo, fez o pedido primeiro. Toninho entrou com seu próprio pedido dias depois e o impasse ganhou destaque.


Ao final, Mani reconheceu a autoria e desistiu formalmente do registro, evitando um desgaste maior. O que esse caso mostra? Registrar é essencial, mas criar algo original e provar sua autoria também pesa muito na balança da legitimidade.


E se o caso Vênus Podcast virar disputa judicial? Quem tem razão?


Esse é o tipo de caso em que o juiz não vai encontrar respostas fáceis. De um lado, temos o Vênus Podcast, notório, consolidado, com grande audiência e uma identidade construída ao longo dos anos. Do outro, o Vênus Day Talks, projeto recente, com proposta distinta, que teve o cuidado jurídico de registrar o nome no INPI antes da confusão.


Em tese, o direito de uso da marca no Brasil é de quem registra primeiro. E o Vênus Day Talks o fez antes. Ainda que o registro ainda esteja em exame, o protocolo já confere prioridade de uso e proteção contra concorrentes posteriores.


O Vênus Podcast até poderia tentar reverter a situação alegando ser mais conhecido e que o nome do outro podcast causa confusão no público. O problema é que “Vênus”, por si só, é um termo de uso comum, associado a ideias de feminilidade, beleza, mitologia, astrologia… tudo isso dificulta que qualquer uma das partes alegue exclusividade absoluta sobre o nome.


Por isso, o cenário mais provável (e recomendável) é que as partes negociem uma solução amigável, com ajustes de branding, delimitação de públicos e eventuais restrições de uso. Judicializar a disputa seria possível, mas custoso, desgastante e com resultado incerto para ambas as partes.


O que podemos aprender com isso?


A confusão entre dois podcasts com nomes parecidos deixa lições valiosas para quem quer criar uma marca forte e evitar dores de cabeça no futuro. Aqui vão cinco aprendizados que todo empreendedor, criador de conteúdo ou profissional autônomo precisa levar a sério:


1. Ser famoso não basta

Ter seguidores, audiência ou reputação não garante o direito exclusivo sobre um nome. Só o registro oficial no INPI protege você de verdade.


2. Nomes parecidos geram confusão (e confusão custa caro)

Mesmo que o nome não seja idêntico, se for parecido o suficiente para confundir o público, já pode dar problema. E sim, isso é levado em conta legalmente.


3. Pesquisar antes de criar evita dor de cabeça

Antes de se apegar a um nome, procure saber se ele já está em uso. Vale buscar no Google, nas redes sociais, no Spotify e, principalmente, no site do INPI.


4. Registrar cedo é sempre mais seguro

Quanto antes você registrar, melhor. Não precisa ter CNPJ. Você pode fazer isso como pessoa física e o registro pode incluir nome, logo, slogan e até sons. Na dúvida, busque um profissional para ajudá-lo.


5. Criar algo original é sempre o melhor caminho

Marcas genéricas, modinhas ou inspiradas em outras já existentes são mais fáceis de dar problema. Invista em algo que seja verdadeiramente seu e que ninguém confunda.


Todos os envolvidos poderiam ter agido melhor. Camila deveria ter confirmado com mais atenção. O Vênus Day Talks deveria ter escolhido um nome mais distinto. O Vênus Podcast deveria ter feito o básico: registrar sua marca.


Esses erros acumulados se transformaram em um caso nacional. E quando isso acontece, não adianta dizer que foi sem querer. A reputação sente. A marca sente. O público percebe.


O caso Vênus × Vênus não é apenas sobre direitos autorais, podcasts ou deslizes de agenda. É um lembrete direto e necessário: marca boa é marca protegida. Se você está construindo algo, trate sua marca como patrimônio. Porque ela é. E se não proteger agora, alguém pode proteger primeiro. E talvez não seja você.

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