top of page

Felca, a polêmica da adultização e a lição sobre responsabilidade na internet

  • Foto do escritor: Andressa Wulf
    Andressa Wulf
  • 11 de ago.
  • 4 min de leitura
Felca segurando celular durante vídeo sobre adultização de crianças e adolescentes, discutindo responsabilidade na internet.

Nos últimos dias, o nome de Felca tomou conta das redes sociais. Para quem já acompanha seu trabalho, ele é conhecido pelo humor afiado, comentários irônicos e vídeos irreverentes. Mas, desta vez, o assunto que colocou seu nome na boca do povo não tinha nada a ver com piadas. O influenciador decidiu enfrentar um tema delicado: postou um vídeo sobre a “adultização” de crianças e adolescentes.


Foram meses de pesquisa, observação e montagem de roteiro. Para construir os exemplos e ilustrar seu argumento, Felca seguiu determinados perfis que exibiam conteúdos típicos desse processo de adultização. E foi justamente aí que o problema começou. Ainda durante a produção, quando o vídeo sequer estava pronto, alguém distorceu a situação, afirmando nas redes que ele seria um ped0fIlo. A falsa acusação encontrou terreno fértil para se espalhar e, em pouco tempo, a mentira estava circulando em timelines, grupos e comentários.


Quando o vídeo foi finalmente publicado, as medidas judiciais contra os responsáveis já estavam em andamento. Felca agiu imediatamente, acionando judicialmente quem propagou a acusação. A reação, por si só, já é um recado claro: as palavras têm consequências, mesmo no ambiente digital. O mais surpreendente veio depois. Em vez de buscar indenizações para si, Felca apresentou uma proposta de acordo que chamou a atenção. Quem quisesse encerrar o processo deveria doar R$ 250 a uma instituição beneficente voltada para crianças e adolescentes. Nenhum valor iria para o seu bolso.


Esse gesto inverte a lógica comum das disputas judiciais. Em vez de transformar o processo em um instrumento de ganho pessoal, Felca o utilizou como um veículo de conscientização. É uma resposta que tira o embate do campo pessoal e o coloca em um patamar mais amplo: a ideia de que, se você errou, precisa reparar e, de preferência, de um modo que gere um impacto positivo para outras pessoas.


A falsa sensação de impunidade on-line

Esse caso nos obriga a encarar um ponto que muita gente insiste em ignorar: a internet não é um espaço sem regras. Existe uma sensação ilusória de liberdade absoluta, alimentada pelo distanciamento físico, pelos perfis anônimos e pela velocidade das publicações. Essa sensação leva alguns a acreditarem que podem dizer qualquer coisa, atacar qualquer pessoa, inventar qualquer história, sem que isso gere consequências. A realidade é o oposto.


As leis se aplicam tanto ao que acontece no mundo físico quanto ao que se passa nas redes. Mais do que isso, a internet amplia o alcance das palavras e, portanto, potencializa o dano que elas podem causar. Uma frase dita em um círculo restrito pode se perder no tempo. Já um comentário nas redes pode ser compartilhado, printado e arquivado, sobrevivendo por anos e voltando para cobrar seu preço quando menos se espera.


O que podemos aprender com o caso do Felca?

O episódio do Felca nos oferece um conjunto valioso de lições. A primeira é simples, mas essencial: responsabilidade não desaparece quando você está atrás de uma tela. Toda vez que publicamos algo, estamos assinando, de forma implícita, uma declaração de que aquilo reflete a nossa visão e que estamos dispostos a assumir as consequências dela.


Outra lição é a importância de refletir antes de agir. A velocidade das redes incentiva reações impulsivas. É fácil compartilhar algo no calor do momento, comentar sem pensar ou entrar na onda de uma crítica coletiva. O problema é que, quando o alvo é uma pessoa real (e quase sempre é), esse impulso pode se transformar em um ataque injusto.


Por isso, vale criar pequenos filtros pessoais antes de postar:

  • Pergunte-se: “Eu diria isso cara a cara para essa pessoa?”

  • Cheque a fonte: só compartilhe informações que possam ser confirmadas.

  • Evite acusações sem provas: o risco de prejudicar injustamente alguém é real e grave.

  • Reflita sobre o tom: é possível expressar discordância sem recorrer à agressão ou humilhação.


Outro ponto importante dessa história é a noção de reparação. Muitas vezes, errar é inevitável. Somos humanos, e a comunicação online é rápida e cheia de ruídos. Mas, quando percebemos que prejudicamos alguém, existe um caminho de volta. Pedir desculpas é um primeiro passo, mas ações concretas falam mais alto. No caso de Felca, a proposta de doação como acordo judicial transforma a reparação em algo que ultrapassa a esfera individual e chega a beneficiar uma causa social.


Essa atitude é rara e valiosa. Ela mostra que é possível transformar um episódio de conflito em uma oportunidade de aprendizado e benefício coletivo. Ao mesmo tempo, serve como exemplo para quem pensa que um erro on-line pode ser consertado apenas apagando o post. O que foi dito pode continuar repercutindo e reparar o dano exige mais do que simplesmente sumir com a publicação.


Um convite à reflexão

A grande pergunta que fica depois desse caso é: como queremos usar o poder que temos nas mãos? Porque, no fundo, todos nós, ao entrar nas redes, nos tornamos produtores de conteúdo. Nossas palavras, imagens e interações chegam a pessoas que nem conhecemos. Essa é uma responsabilidade imensa e, muitas vezes, subestimada.


Se o que você está prestes a postar fosse sobre você, você ficaria tranquilo ao ver aquilo circulando? Se não, talvez seja hora de reconsiderar. A internet não esquece, e como o caso Felca demonstrou, ela também cobra. Às vezes, imediatamente, outras vezes, anos depois, mas sempre com o peso das consequências.


Andressa Wulf

Advogada - OAB/SC 60.351

Comentários


logo whatsapp
bottom of page